terça-feira, 16 de julho de 2013

Desconfiança

Tal como as ciências ocultas também as religiões são muitas. Deuses são aos pontapés, profetas são mais que as mães e sacerdotes há-os das mais variadas formas, credos e feitios, espalhados pelos 4 cantos deste mundo e do outro. Vêm estas afirmações a propósito do texto da autoria de Gonçalo Portocarrero de Almada publicado neste jornal no dia 15 do corrente mês de Julho intitulado “Ciências mais ou menos ocultas, há muitas…”
                Longe de mim pretender ombrear em sabedoria e profundidade de visão com um licenciado em Direito e doutor em Filosofia mas, olhando a fotografia de Gonçalo e lendo aquilo que escreve, vislumbro apenas um padre que, como os mais vulgares, é lesto a pôr em causa estudos e conclusões de quem não teme ao seu Deus sem lhe passar pelo espírito a possibilidade de pôr em causa a verdade que professa. Como pode alguém que aceita os milagres aprovados pela Congregação da Causa dos Santos duvidar, por um momento que seja, das conclusões de uma qualquer Associação dos Veteranos da Psicoterapia do Bolhão? Deus me perdoe o atrevimento de brincar com estas coisas mas o tom zombeteiro do referido texto do padre Gonçalo dá-me alento para libertar esta pueril blasfémia: os milagres atribuídos ao Papa João Paulo II são dignos do tempo em que os animais falavam ainda que um deles tenha sido realizado através de um aparelho de televisão. Já ia sendo tempo de dar um ar científico à coisa…
                Incomoda-me um pouco que o padre Gonçalo refira os totalitarismos nazi e soviético, reprovando os seus crimes hediondos, esquivando-se a referir o terceiro corno do diabo que foi a Santa Inquisição, essa filha bastarda da igreja católica. Sugere o padre Gonçalo um memorial em honra das vítimas dos estudos da ciência, talvez não fosse atrevimento demasiado propor uma referência nesse memorial aos que caíram em nome do Deus católico. Conhecerá melhor do que eu as subtilezas do mafarrico e como é ele capaz de confundir as almas mais santas.
                O problema é o da co-adopção de crianças por casais homossexuais e dos estudos que sugerem não haver problemas de maior em aceitar essa “causa fracturante”. Termino lembrando ao padre que talvez o cerne dessa questão esteja com as pessoas e aquilo que lhes vai na alma e não com as suas orientações sexuais, políticas ou religiosas. Em termos de protecção e educação de menores a igreja não terá grande moral para estabelecer os limites a respeitar não obstante tantas obras de extraordinário valor humano e social erigidas por instituições católicas. Anda por aqui muita confusão. Caro padre Gonçalo, divirta-se lá com a sua tuna universitária e… desconfie.

Rui Silvares
(Público, 18-7-2013)

1 comentário:

  1. Li com atenção o seu texto, como sugeriu e agradeço,mas agora é a minha vez de sugerir a leitura de um texto com o qual me identifico: http://amar-abrantes.blogs.sapo.pt/681094.html

    Santana-Maia Leonardo

    ResponderEliminar

Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.