sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Quase verdade

História que não aconteceu

Depois de muitas habilidades habilidosas lá se arrumou a herança. Alguém foi para as entidades oficiais fazer os registos de propriedade enquanto se foram fazendo as escrituras. A família era grande e a propriedade dos bens nunca tinha sido devidamente registada senão nuns pseudo testamentos feitos em papel de 25 linhas que se foram guardando. Até que naquele dia o assunto ficou arrumadíssimo, e o jovenzinho da família lá ficou com um bocado de terreno.
Como era ali perto o jovem mobilizou alguns amigos para irem ver a herança. O tal bocado de terreno ficava numa zona quase histórica da vila, entalado entre quatro prédios sem possibilidade de se alargar. Depois do primeiro silêncio o amigo que tinha sido colega no Liceu e agora cursava arquitectura animou o herdeiro com um eh! Pá! faz-se em altura, aproveita-se toda a área para os andares e umas varandas bem salientes aliciarão os compradores. O que tinha um pai engenheiro ligado a uma boa empresa, prometeu pedir ajuda para limar-se as dificuldades. E o amigo ligado à banca prometeu o necessário suporte financeiro.
Além lembrou que havia falta de estacionamento e as construções naquela zona não tinham garagens por características do terreno o que tornariam pouco apelativas e poderia não se venderem tão rapidamente como se precisava para pagar empréstimo e guardar os ganhos. Mas logo o ligado às engenharias informou que actualmente fazer um ou dois pisos enterrados já não é problema dado os novos conhecimentos sobre fundações. Era só fazer um buraco fundo, adorná-lo de paredes de betão, colocar um tecto suportado por uma ou duas vigas, fazer o mesmo por cima e pronto. Mais umas rampas bem inclinadas e os carros entrariam e sairiam. 
À noite à mesa do jantar foram ajustados mais uns pormenores e iniciaram-se os contactos com o construtor, também do círculo dos amigos pois como era negócio particular não era preciso concurso público. Estimou-se o empréstimo bancário, fizeram-se uns telefonemas e pela manhã o projecto foi entregue nas entidades oficiais e logo as máquinas começaram a trabalhar.
E as máquinas rasparam o terreno e começaram a escavar a escavar. Rapidamente veio uma autorização cautelar que foi colocada em grande cartaz como definitiva e até apareceram possíveis compradores de parcelas a pedir informações sobre condições de aquisição tal era a exuberância do projecto.

Mas, entretanto, o custo do escava-escava e reforço dos suportes de betão face às características do terreno, exauriu o empréstimo bancário e sem dinheiro e sem obra para renegociar outro empréstimo as máquinas foram-se embora e ficou apenas um buraco identificado pelo tal cartaz.    

Publicado em Jornal Costa do Sol em 3 de Dezembro de 2014   

1 comentário:

Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.