quarta-feira, 28 de outubro de 2015

LIBERDADES

                               DA LIBERDADE DE IMPRENSA

…O principal, por ora, a conquistar, em amena cooperação entre escritores e leitores de jornais, é repor a normalidade do regime do ónus da prova. Não se pode admitir o critério corrente de que o que não foi desmentido foi admitido. Tal não vale para a polícia, nem vale para os tribunais, pelo que não pode ser prerrogativa da Imprensa.
Ou a notícia é devida e factualmente fundada ( e exibe os necessários sinais da sua seriedade) – como mandam as boas regras, mas omitem as más excepções – ou expressamente se reconhece interrogativa ou especulativa, ou ninguém pode ser interpelado por um alegado facto na exclusiva e precária base de que o não desmentiu.
Assumir esta conduta é, não só mais cómodo e prático, como constitui a única forma de ajudar a imprensa a tornar-se mais exigente na notícia, na exacta medida em que o público se vai tornando mais céptico perante ela. Jornalistas e leitores deverão, portanto, ser os grandes agentes do instante combate à leviandade impune.
                                             (…)
Entretanto, a hipótese mais corrente para o visado se defender dos abusos é a formalíssima carta que invoca a lei de imprensa. O resultado é mais ou menos assim:
N. da  R. -  Tomamos nota das declarações do sr. X. Contudo, 73 fontes que solicitaram o compreensível anonimato dizem tê-lo visto com fulano, beltrano e sicrano a a passear no parque da cidade, entrar furtivamente no gabinete do presidente da Câmara  e almoçar num conhecido restaurante com aquele grupo de amigos do partido. De qualquer modo o sr. X não desmente o essencial da notícia.
A segunda hipótese é escrever:
“Sr Director: em relação à notícia tal, agradecia a V. Exa a publicação, não de um desmentido – longe disso!... – mas de alguns aperfeiçoamentos”. Depois fala-se a verdade, não se fala em lei de imprensa e é tudo entre cavalheiros. Só que o resultado, no comum dos jornais, não é muito mais encorajante. A Nota da Redacção diz lacónica e polidamente: “Publicamos com gosto a carta do sr. X. Ainda que, como ele próprio refere, não se trate de um desmentido ao essencial do publicado.
Mas a terceira e mais sábia solução é mesmo nem desmentir.

NOTA – Extratos de uma crónica de Nuno Brederode Santos há anos publicada no “Expresso” e aqui transcrita por Amândio G. Martins.



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