segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

DISPERSOS

                                                          DE AGOSTINHO DA SILVA
Dando expressão política a particularidades geográficas e étnicas, interessada pelo comércio marítimo e aguilhoada ainda pelas ambições e planos de Borgonha e de Cister, se constitui a nação no séc. XII como independente de seus irmãos de Ibéria. Embora a tarefa principal tenha sido a de empurrar o mouro para o Sul, com as fronteiras provisórias, sempre avançadas, do Douro, do Mondego, do Tejo e do mar de Algarve, não se deixou de pensar na raia de Leste e, durante séculos, foi uma das determinações da vida do país a oposição, com fortuna vária, a Leão e Castela, quase sempre confundidas com a totalidade da Espanha, que bem virada estava a outros pontos.
Internamente, se estabelece Portugal com uma rede de municípios republicanos e democráticos, cada um com a sua constituição adequada às características locais, confiando-se a representação ou convivência de todos eles a delegados que se reuniam em Cortes, sem prazo fixo, e aí discutiam dos problemas particulares ou comuns do Reino; a tudo coordenando, havia o Rei, simultâneamente hereditário e electivo, ainda que por sanção, Rei sem capital fixa, mais fiando de seu passo que de um Paço; donde estava vigiava, ouvia, ordenava, dispunha, melhorava e, às vezes, pois que humano, piorava.
O económico se firmava no comunitarismo agrário e pastoril, mais tarde alargado ao mar, com as aldeias na posse colectiva de suas terras e de seus instrumentos de trabalho e de vida, mas com economia de mercado no que tangia ao produto de seus sorteados lotes; o que não era do Povo era do Rei, dos nobres ou do clero: de alguma forma, daqueles a que o geral se confiava para o governo ou a defesa ou o transcendente, no qual último, ainda que diluída, se guardava a lembrança anti-romana do priscilianismo e se havia de mostrar o joaquinismo como forte muro nacional: Deus e Papa se distinguiam claro. Fora uma ou outra escola – e a experiência da Universidade não foi das melhores – se educava a gente menos em escrituras do que se via nítido e no que vivia profundo. O que daria seu fruto. Ou “fruito”, como então se dizia e mais belo encontro .
Com o ferrolho de Aljubarrota a fechar por algum tempo os portões do Norte e do Leste, se abriam, para continuar o impulso inicial, o mar do Algarve e o do Grande Oceano. Dava aquela varanda para a inteira África, ou pela travessia do Magrebe ou pelas conhecenças de costa; dava o segundo para tudo que fosse necessário para, pela primeira vez, circum-nevagar o Globo. No duplo empreendimento se esgotaram todas as possibilidades da Nação, a si própria pondo de lado: ao ordenar da casa, se preferiu a exploração, ou invenção, de um mundo que cidade fosse; houve a curiosidade de saber e o gosto da experiência, sobrelevando o do experimento, por ela depois desencadeado, mas noutras terras; houve a cobiça do ouro e a aventura da navegação, do combate e do roubo; houve o espanto e a adoração do descoberto; houve a esperança de uma religião ecuménica. De tudo resultou que se verificaram a unidade dos mares e o ilhamento dos continentes.Tudo se foi pagando, a partir de D. João II, na frustração da política, da economia, da educação e da transcendência do país.


NOTA – Texto compilado por Amândio G. Martins

Sem comentários:

Enviar um comentário

Caro(a) leitor(a), o seu comentário é sempre muito bem-vindo, desde que o faça sem recorrer a insultos e/ou a ameaças. Não diga aos outros o que não gostaria que lhe dissessem. Faça comentários construtivos e merecedores de publicação. E não se esconda atrás do anonimato. Obrigado.

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.